Não tenho qualquer documento de compra do imóvel porém nele resido há mais de 10 anos. Ainda sim, é possível regularizar no RGI?


USUCAPIÃO

MUITA GENTE ainda confunde os requisitos necessários para as mais variadas espécies de USUCAPIÃO autorizadas pelo ordenamento jurídico brasileiro. Como sempre falamos aqui, em síntese, será comum a todas elas a exigência de COISA HÁBIL a permitir a aquisição pela usucapião, o TEMPO necessário que variará conforme a modalidade estudada e a POSSE que precisa ser uma posse com ânimo de dono, mansa e pacífica e por tudo isso suscetível de permitir o fenômeno da prescrição aquisitiva.

Uma modalidade muito importante é a USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA disciplinada pelo art. 1.238 do Código Civil, que reza:

“Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis”.

A Usucapião Extraordinária admite ainda a REDUÇÃO DO PRAZO de 15 (quinze) anos para 10 (dez), desde que preenchidos os requisitos do parágrafo único do referido art. 1.238:

“Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo”.

Inexiste nela a necessidade de metragem do imóvel como acontece com a espécie USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA, onde o prazo necessário de posse são 05 (cinco) anos.

A doutrina acertada dos ilustres professores FARIAS e ROSENVALD (Curso de Direito Civil. 2023) destaca:

“O mais significativo requisito formal da usucapião extraordinária – como de qualquer outra modalidade de usucapião – é o tempo. O fator tempo é fato fundamental para a conversão da posse em propriedade. (…) O art. 1.238 do Código Civil, atento ao princípio da operabilidade, reduziu os prazos da usucapião extraordinária de 20 para 15 ou 10 anos, conforme o TIPO DE POSSE praticada. De acordo com a diretriz da socialidade do Código Civil de 2002, há dois modos de possuir capazes de alcançar a usucapião: a POSSE SIMPLES e a QUALIFICADA. A posse simples é aquela que se satisfaz com o exercício de fato pelo usucapiente de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do CC), conduzindo-se o possuidor como o faria o dono, ao exteriorizar o poder sobre o bem. (…) Mas, se além de demonstrada a posse, qualificar-se a ocupação do bem pela concessão de FUNÇÃO SOCIAL, por intermédio de efetiva MORADIA do possuidor no local ou realização de OBRAS E SERVIÇOS DE CARÁTER PRODUTIVO (parágrafo único do art. 1.238 do CC), o usucapiente será agraciado pela REDUÇÃO do prazo para DEZ ANOS”.

Efetivamente é importante relembrar que nessa modalidade a Lei dispensa expressamente a necessidade de TÍTULO BOA-FÉ (caput, art. 1.238) de tal modo que apenas caberá ao interessado a demonstração dos requisitos mencionados acima.

As provas em sede de Usucapião deverão buscar a comprovação do exercício da posse pelo tempo exigido em Lei. Em sede de USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL – aquela realizada sem processo judicial, nos termos do art. 216-A da LRP, com regulamentação pelo Provimento CNJ 65/2017 – a Lei exigirá a realização da ATA NOTARIAL que é um meio de prova (art. 384 do CPC/2015) que no caso será realizado pelo Tabelião ou seu preposto voltado à comprovar a posse exercida pelo interessado.

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Como se vê na valorosa decisão abaixo, é muito importante conhecer cada modalidade de usucapião bem como seus requisitos, já que haverá variação de uma espécie para a outra:

TJRJ. 0072852-87.2018.8.19.0001 – APELAÇÃO. J. em: 02/02/2023 – VIGÉSIMA SÉTIMA CÂMARA CÍVEL. Apelação. Ação de Usucapião. Sentença que julgou procedente o pedido para declarar o domínio dos autores, por entender preenchidos os requisitos para o reconhecimento da USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. Se o pedido deduzido foi o de declaração de aquisição da propriedade do imóvel, seja pela Usucapião Especial Urbana ou USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA, por posse qualificada pela moradia, cabe ao juiz avaliar o preenchimento dos requisitos legais, sem que tal importe em violação ao PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO. Há de se considerar a Usucapião Especial Urbana e a Usucapião Extraordinária, por POSSE QUALIFICADA pela moradia, uma como subespécie da outra, pois ambas estimulam a conduta socialmente relevante, consistente na utilização do imóvel para moradia habitual, e independem de justo título e boa-fé. Nos termos do art. 183 da Constituição Federal e do art. 1.240 do Código Civil, para a de prazo mais exíguo de 05 anos (Usucapião Especial Urbana), O IMÓVEL DEVE SER INFERIOR A 250m² e o usucapiente NÃO PODE SER PROPRIETÁRIO DE OUTRO IMÓVEL, requisito este que INEXISTE para a Usucapião Extraordinária, qualificada pela moradia, de 10 anos, prevista no parágrafo único do art. 1.238 do Código Civil. Na espécie, os usucapientes afirmam que exercem a posse do imóvel há mais de 22 anos e que nele estabeleceram a sua moradia habitual, motivo pelo qual se torna desnecessário, por ausência de interesse processual, sob o ponto de vista prático, perquirir o preenchimento dos requisitos da Usucapião Especial Urbana. Usucapientes que alcançaram o prazo para Usucapião Extraordinária qualificada pela moradia, com base no parágrafo único do art. 1.238 c/c 2.029 do Código Civil de 2002, no período de 30/06/1996 a 30/06/2006. (…). Instrução probatória a confirmar que até a propositura da ação tiveram os autores no mínimo 22 anos de posse mansa, contínua e pacífica, tendo incontroversamente firmado residência no local. Sentença mantida, todavia, com base no preenchimento dos requisitos da Usucapião Extraordinária, na forma prevista no parágrafo único do art. 1.238 c/c 2.029 do Código Civil, nos termos da fundamentação. RECURSO DESPROVIDO”.

Original de Agência Brasil



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